VLADIMIR DEMIKHOV E O CÃO DE DUAS CABEÇAS
Chamar o médico soviético Vladimir Demikhov de cientista maluco pode estar prejudicando suas contribuições para o mundo da medicina, mas algumas de suas experiências radicais certamente se encaixam no título. O caso em questão - embora possa parecer mito, propaganda enganosa ou um caso de história photoshopada - na década de 1950, Vladimir Demikhov realmente criou um cão de duas cabeças e tudo foi provado com fotos e vídeos da época.
As imagens, descritas então como “repulsivas”, documentam um novo experimento do cientista soviético que liderava o conhecimento de transplante de órgãos no país. Quando a notícia da operação chegou aos Estados Unidos em 1959, Vladimir Demikhov, com 43 anos, já realizava transplantes em cães havia meia década.
Filho de um camponês, Demikhov foi mecânico e técnico de consertos antes de ingressar na faculdade de biologia da Universidade Estatal de Moscou.
Demikhov realizou seu primeiro experimento inovador menos de dois anos após iniciar os estudos. Em 1937, impressionou a comunidade médica russa quando criou um coração artificial e o implantou com sucesso em um cachorro. O cão viveu por duas horas após a cirurgia – expandindo as fronteiras do transplante de órgãos, uma ciência pouco estudada até então, mas vital para a medicina atual.
Para essa cirurgia, Demikhov escolheu dois cachorros, um deles um pastor alemão de rua que Demikhov chamava de Brodyaga e um cachorro menor chamado Shavka. Brodyaga seria o cão hospedeiro, e Shavka forneceria a cabeça e o pescoço secundários.
Com a parte inferior do corpo de Shavka amputada abaixo das patas dianteiras (mantendo seu próprio coração e pulmões conectados e uma incisão correspondente no pescoço de Brodyaga onde a parte superior do corpo de Shavka se ligaria, o resto era basicamente reconstrução arterial - além de anexar as vértebras dos cães com fios de nylon.
Graças à grande experiência da equipe, a operação levou apenas três horas e meia. Depois que o cachorro de duas cabeças foi ressuscitado, as duas cabeças podiam ouvir, ver, cheirar e engolir. Embora a cabeça transplantada de Shavka pudesse beber, ela não estava conectada ao estômago de Brodyaga. Tudo o que ela bebeu fluiu através de um tubo externo para o chão.
De acordo com os registros, Demikhov teria criado pelo menos 20 criaturas na Alemanha Oriental nos anos 50 e 60. Enquanto a maioria dos seus animais só sobreviveu alguns dias, o mais notável conseguiu viver por 29 dias, e se uma veia na região do pescoço não tivesse sido acidentalmente danificada, ele poderia ter sobrevivido por muito mais tempo.
Realmente foi um experimento incrivelmente inovador e bem sucedido, mas as implicações morais da experiência de Demikhov foram graves. Esse transplante de cabeça, ao contrário de alguns de seus outros avanços no campo da transplantação, não tinha aplicações na vida real. Mas esta não foi a primeira vez que alguém fez este tipo de procedimento, em 1908, o cirurgião francês Dr. Alexis Carrel e seu parceiro, o fisiologista americano Dr. Charles Guthrie, tentaram o mesmo experimento. O seu cachorro de duas cabeças
inicialmente se mostrou um sucesso, mas se degradou rapidamente e foi sacrificado em poucas horas.
As experiências posteriores e mais ousadas de Demikhov também atraíram a atenção de países da Europa. Até então, os médicos acreditavam que não era possível transplantar órgãos porque o sistema imunológico do paciente rejeitaria o órgão. Mas tudo mudou quando as notícias sobre o sucesso de Demikhov se espalharam pelo mundo.
Na década de 1960, médicos americanos viajaram para a Rússia para aprender sobre as técnicas inovadoras usadas por cirurgiões locais. Uma das principais, mais tarde adotada pelos Estados Unidos, Canadá e Japão, foi o uso de grampos para comprimir veias e artérias durante operações, o que reduzia drasticamente o tempo de cirurgia.
Até 1962, vários membros da comunidade médica americana haviam mudado de opinião, e os médicos dos EUA que viram Demikhov trabalhando, foram aos poucos percebendo a possibilidade de transplantar órgãos humanos com sucesso.
Em 1965, Demikhov participou de uma conferência médica onde ele propôs a criação de um banco onde órgãos humanos poderiam ser armazenados para as necessidades de cirurgias futuras. A proposta futurista, impensável na época, provocou ira entre os acadêmicos soviéticos, que o criticaram e exigiram o fechamento de seu laboratório.
Isso foi uma um grande choque para Demikhov, mas mesmo assim ele permaneceu sendo o diretor do Centro Republicano para Reprodução Humana do Ministério da Saúde da Rússia, e aos poucos as suas ideias de pesquisa na área de transplante de órgãos entraram em declínio – assim como a fama internacional.
O cientista pioneiro morreu em um pequeno apartamento nos arredores de Moscou em 1998, aos 82 anos. O valor de suas experiências, que eram vistas com suspeita pelas elites médicas soviéticas, foi reconhecido pelo Estado russo no final de sua vida. Demikhov foi premiado com a Ordem de Serviços para a Pátria em 1998, o ano de sua morte. Mas são as vidas salvas por transplantes de órgãos o seu verdadeiro legado.
Comentários
Postar um comentário